- [reabrem o STP, o Palácio, M. vai iniciar o «3.º Degrau...]; reabre o «ALPA», com a releitura do momento: Palomar, de I. Calvino]:
RECORTE(S): [2 parágrafos iniciais]
Numa época e num país no qual todos se pelam por proclamar opiniões ou juízos, o senhor Palomar ganhou o hábito de morder a língua três vezes antes de fazer qualquer afirmação. Se, à terceira dentada na língua, ainda está convencido daquilo que estava para dizer, di-lo; se não, fica calado. Com efeito, passa semanas e meses inteiros em silêncio.
Boas ocasiões para ficar calado nunca faltam, mas também acontece que o senhor Palomar lamente não ter dito alguma coisa que poderia ter dito no momento oportuno. Apercebe-se de que os factos confirmaram aquilo que ele pensava e que, se então tivesse exprimido o seu pensamento, talvez tivesse tido uma influência positiva qualquer, ainda que mínima, sobre o que aconteceu. Nestes casos o seu espírito divide-se entre a satisfação de ter visto com acerto e um sentimento de culpa pela sua excessiva reserva. Sentimentos ambos tão fortes que é tentado a traduzi-los por palavras; mas após ter mordido a língua três vezes, aliás, seis, convence-se de que não tem nenhum motivo de orgulho ou de remorso. [...]
[sublinhados acrescentados;do texto «Acerca do morder a língua», 1.º de «Palomar na sociedade» (II «sub-parte» da III parte, «OS SILÊNCIOS DE PALOMAR »)
Italo Calvino (1923-1985), Palomar [1983], 2021, D. Quixote, p. 125-126