segunda-feira, 17 de setembro de 2012

1955 - Amadeu Baptista

[T. é da «colheita» de  55 - Hum, a Memória daquela garrafa de CR&F Reserva, de austero rótulo
- deambulando, enquanto os Infantes tinham o comportamento habitual, isto é, .... [querias...] foi lendo «um poema para cada ano», proposta deste recente livro de Amadeu Baptista]

Mil Novecentos e Cinquenta e Cinco

Estão a chover ursos de peluche
no meu cobertor,
lá fora é quase dia,
o pai ligou a máquina de barbear
e a mãe cicia
como só as mães ciciam,
com quadradinhos de açucar
e luzes a acender e a apagar
dentro da boca.
 
Já aqui veio três vezes
aconchegar-me a roupa,
dizer coisas parecidas com o vento a deslizar 
entre as folhas das árvores,
um coelhinho branco a correr entre este canto
e aquele,
um perfume parecido com o meu
quando me chama gatinho da mamã.

Tive um sono repousado.

Os maus não apareceram.
 
Amadeu Baptista, Açougue. Lisboa, &etc, 2012, p. 11